quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Remida - Parte 12


- Amiga, se você quiser, a gente fica em casa.
            - Não Dani, eu quero ir.
            - Só falar que ficou com dor de barriga, eu ligo pra minha mãe e fica tudo certo.
            - Não Dani. Cedo ou tarde vou ter que ir pra escola.
            - Mas Mari, você não tem obrigação de ir agora. Acho que nem eu quero ir.
            - Dani nós jogamos hoje, esqueceu?
Silêncio. Eu sei que a Dani só queria me proteger, evitar que eu encarasse aqueles olhos curiosos, as brincadeiras de mau gosto, o desprezo das meninas – por mais que a maioria delas já tenha mandado fotos nuas de propósito, mas nunca admitiriam isso. Mas eu precisava ir. Não por causa dos jogos, de jeito nenhum por causa do Lucas. Mas por minha causa. Depois da conversa com o Sr. Joaquim, fui tomada por uma coragem que não sei de onde veio. Dani apenas acatou meu pedido, pegou a mochila, deu uma ultima arrumada no batom e fomos à escola.

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Não notei nada de estranho nas primeiras aulas. Agradeci à Deus por tudo estar aparentemente normal, até chegar a hora do intervalo e a diretora resolver fazer uma “reunião” com os alunos antes de voltarmos para as salas. O papo sobre exposição na internet foi agradável (lê-se com ironia). Todos olhavam para mim! Alguns olhavam e desviavam em seguida, outros olhavam e cochichavam com os amigos. Alguns mais corajosos mostravam algo no celular. Eu só queria me esconder, mas não tinha escolha. Se eu levantasse e saísse dali, quando todos estivessem sentados, deixaria estampada que aquela reunião estava acontecendo por minha causa.

Dani segurou minha mão e colocou no colo dela. Mais uma vez me surpreendendo mostrando que pode ser tão “minha mãe” quanto eu posso ser dela.

Não vi o Lucas em nenhum momento na escola. Nas poucas vezes que vi seu grupo de amigos, não consegui olhar para eles tempo suficiente pra ver se ele estava ali no meio; os amigos paravam o que estavam fazendo e começavam a mexer comigo com assovios e risadinhas.

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Cheguei em casa, coloquei a pesada mochila em cima do sofá, procurei rapidamente por minha mãe e considerando o silêncio, concluí que ela não estava em casa. Fui diretamente para o banho e, por alguns minutos, deixei a água rolando no chuveiro e estava me encarando no espelho. Ainda era quinta-feira e eu tinha passado de desconhecida para nova namorada do Lucas e da noite para o dia me tornei “a menina da foto”.
Pensava todas estas coisas me olhando profundamente nos olhos, até começarem a se encher de lágrimas, até cada uma delas parecer que pesava cem quilos. Elas caíam com força, sem pedir licença, apenas saltando como se levassem toda essa confusão de sentimentos. Como?
Senti saudades, de repente, de uma semana atrás. Quando o máximo que me aproximava da menina que havia me tornado era ficar deitada na cama com a Dani imaginando maneiras improváveis do Lucas notar minha existência. Eu sabia que não poderia. Eu sabia que não deveria. Tudo em mim dizia pra eu fugir!
Entrei debaixo do chuveiro e deixei as lágrimas irem. Eu queria gritar, queria acabar com tudo. Era uma surra de sentimentos que eu não conseguia discernir. Sentei no chão, não liguei pra nada, havia coisas demais dentro de mim e eu precisava colocar para fora.
Ainda dentro deste caos, eu me sentia tão sozinha. Não só por estar literalmente sozinha em casa, mas porque parecia que eu era a única no mundo que estava passando por essa situação.
Levantei, acabei o banho, me sequei e vesti a roupa. Quando saí do banheiro, me joguei no sofá e decidi ligar o celular de novo. Fui passando mensagem após mensagens de garotos perguntando se eu cobrava caro, outros pedindo fotos exclusivas, até meninas me julgando e me chamando de todos os nomes possíveis. Três mensagens da Dani perguntando se eu tinha chegado bem e se eu queira que ela viesse para cá. Duas mensagens da minha mãe avisando que tinha comida pronta na geladeira. Cinco mensagens no grupo da família, sendo 3 vídeos de piadas sobre o Lula – pelo menos meus parentes não sabiam de nada. Uma mensagem de um número que não estava salvo, mas já tinha visto antes.
011 99999-9999
8:47 “Oi Marcela. Que Deus te encontre nessa manhã. Vocês saíram tão rápido de casa, não pude nem te lembrar sobre seu encontro de hoje, por isso resolvi mandar essa mensagem. Não se esqueça: Ele está ansioso pra te ouvir. Fique com Deus. Sr. Joaquim”
Fui atingida por um incômodo enorme no momento que li essa mensagem. Eu tinha esquecido completamente dessa promessa!
Eu não faria isso, é claro. Como eu simplesmente poderia fechar os olhos, fingir que Deus estava na minha casa, silenciosamente me ouvindo falar o quanto fui burra de transar com um garoto

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