segunda-feira, 18 de abril de 2016

Remida - Parte 3

            -A-mi-ga! – Disse Dani, se escorando no meu ombro, enquanto eu caçava os sapatos dela. – Sabia que vocês iam ficar juntos!
            -Não ficamos juntos, Daniele. Nem nos beijamos... achei! – Comemorei ao encontrar os sapatos perdidos.
            -Como assim? O que aconteceu então?
            - Ah, ele me viu sozinha lá fora, viu que eu encarava ele, depois me chamou pra ficar com ele e os amigos... mas nada aconteceu. – Eu não queria contar pra Dani sobre as drogas... talvez ela não acreditasse que o Lucas não usa, e ela poderia ficar com uma visão errada dele.
            -MARCELA! – Ela gritou. – Como assim, nada aconteceu? Você estava com ele e os amigos dele, e não aconteceu nem um beijinho? – Dani sentou para calçar os sapatos, e seu olhar parecia assustador.
            -Não cara, já disse. Pouco tempo depois eu tive que te procurar... fiquei preocupada contigo e sei bem como você fica nessas festas. – Dani acabou de calçar os sapatos, ficou em pé e me abraçou. Logo começamos a andar juntas para a saída.
            -Então quer dizer que você deixou de beijar o garoto que você é apaixonada há 3 anos só porque ficou preocupada comigo? – Me abraçou novamente enquanto andávamos. – Essa é a desculpa pro nervosismo mais baixa que eu já ouvi. – E riu.
No domingo de manhã eu estava bem. Havia dormido na casa da Dani depois que o pai dela buscou a gente, e tive a sensação de que cada segundo do lado do Lucas ontem não passou de um grande sonho. Como isso aconteceu? Como o rapaz que eu admiro secretamente começou me notar em uma única noite?
A sensação do braço dele me protegendo, tocando em partes diferentes do meu corpo, mas nada que me assustasse, só pra evitar que outros rapazes fizessem algo. A forma como se ele se prontificou a me ajudar a caçar minha melhor amiga bêbada em uma festa com 300 pessoas... só queria que algo mais tivesse acontecido.
Me levantei, Daniela ainda roncava do outro lado da sua cama de casal. Fui ao banheiro, me olhei bem no espelho. “Será que ele tinha me achado bonita?” pensei. “Bem, ele disse ontem que eu era linda. O que será que viu em mim?”

Depois de algumas horas eu voltei para casa. Não conseguia deixar de pensar em tudo o que houve na noite passada junto com o Lucas. E também não pude tirar da minha cabeça o que os amigos faziam naquela festa. Eles são rapazes bonitos, legais, divertidos, com um futuro promissor pela frente, mas correndo um grande risco.
Não importa; Lucas não usava e não cabe a mim dizer o que é melhor ou pior para ninguém.
O domingo passou rápido. Comecei a assistir uma nova série, terminei o trabalho de história, e quando deu 6 horas da tarde, minha avó me ligou.
            -Oi Marcela!
            -Oi Vó! Como a senhora está?
            -Estou bem, graças à Deus. E você, minha filha?
            -Estou ótima também... aconteceu alguma coisa?
            -Não... é que hoje lá na igreja terá um culto especial. Várias apresentações, inclusive dos jovens. Eles cresceram com você, podem gostar de te ver de novo.
            -Ah, vó, não vou poder ir. – Precisei pensar em uma desculpa rápida. – Preciso terminar um trabalho pra escola... em uma próxima vez eu vou.
            - Tudo bem, minha neta – Ela parecia desapontada e isso arrebentava meu coração. – E a sua mãe? Ela está em casa?
            - Tá sim, só um minuto que eu vou passar pra ela.
Assim que dei o telefone na mão da minha mãe, interrompendo sua programação na televisão, eu fui para o meu quarto. Deitei na cama e comecei a pensar o porquê ter recusado o convite da minha avó. Por que a igreja parecia uma má ideia tão grande, sendo que eu lembro que, na infância, eu amava ir lá e ouvir falar de Deus. Não entendo o motivo da repulsa automática, sendo que, ao contrário do que a minha mãe pensa, Deus nunca fez nada contra mim.
E pensei na minha avó... desde o divórcio dos meus pais, ela vem insistindo para eu e minha mãe voltarmos para a igreja. Ela diz que toda a dor, Deus tira, é só a gente pedir com coração. Que Deus pode restaurar nossa família, que Ele pode nos abençoar. Mas não consigo deixar de pensar que meu pai era um homem de respeito lá dentro. Todos gostavam dele, todos procuravam por ele pra pedir ajuda, era visto como um homem honesto; mas traía minha mãe.

Se meu pai era assim, por que eu confiaria nas palavras de alguém que se diz falar por Deus? Eu amo a minha avó, mas a confiança que eu perdi nos homens honestos da igreja, ela não pode restaurar. Talvez nem Deus possa.

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