Bora começar!
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Se alguém me dissesse que eu passaria o dia todo daquela
terça-feira no hospital com a minha avó, eu não teria acreditado. O que leva
uma senhora de quase 70 anos varrer o chão perto de uma escada dançando forró
com a vassoura? Será que não era óbvio que algo ruim iria acontecer? Minha avó
é uma senhora muito alegre e ativa, mas também é bem desastrada.
Seria um dia normal se ela não resolvesse ser uma dançarina.
Em dado momento da faxina, ela e seu par, o Sr. Vassoura estavam perto demais
da escada que dava para o segundo andar da casa. Ela tropeçou, Sr. Vassoura não
tinha mãos e braços para segurá-la, ela rolou escada abaixo e o resultado foi:
eu desesperada, uma ambulância, ossos quebrados, minha avó fingindo que estava
tudo bem e muitas lesões graves.
Quando cheguei da escola naquela manhã e encontrei minha avó
desmaiada no chão da sala, senti um medo que há muito não sentia. Liguei para a
ambulância, para uma vizinha e tentei manter a calma. Elas me ajudaram, mas conforme
os exames foram saindo, as chances de que minha avó precisaria ficar internada
por bastante tempo aumentavam.
Ela não corria risco de morrer, mas a recuperação do seu
frágil corpinho com muitos anos de vida levaria bastante tempo. Ela era uma
senhora idosa, mas com um espírito muito jovem. Recusou-se a tomar os remédios
preventivos que ajudariam nessa situação... remédios que auxiliariam a
recuperação de ossos quebrados e a cicatrização de machucados. Agora ela
percebia que era importante tomá-los e se arrependia de ter sido tão teimosa.
Éramos só eu e ela desde os meus 8 anos. Meu pai, um rapaz
jovem de uma cidade do interior de São Paulo veio para a capital para estudar e
tentar construir uma vida digna. Minha mãe, filha única, trabalhava na faculdade
que meu pai frequentava. Se apaixonaram, me tiveram, casaram e um belo dia,
quando meu pai foi buscar minha mãe no trabalho, os dois sofreram um grave
acidente de carro, que diminuiu minha família de quatro pessoas, para apenas
duas. Foi um momento difícil de viver, mas a dor e a saudade já haviam passado.
Eu agora tenho 17 anos, sou uma jovem responsável e toda essa experiência só me
ensinou a valorizar as pessoas que estão ao meu redor, principalmente minha
avó.
A família do meu pai guardava muito rancor pelo fato dele
ter ido embora da cidade. Ele quis realmente fugir daquela realidade e procurar
uma vida melhor para ele e a família que ele pretendia ter. No dia que ele saiu
de casa, meus avós paternos e meus tios prometeram esquecer-se da existência do
meu pai. Não fez muita diferença para ele, na verdade, já que sempre se sentiu
diferente e excluído daquela família, mas eles nunca ligaram para saber sobre
mim ou sobre meus pais. Quando eles morreram, ninguém apareceu para o velório
ou enterro. E querem saber de uma coisa? Eu não fazia questão nenhuma que eles
estivessem presentes agora para nos ajudar.
Apesar da minha pequena família com a minha avó, temos uma
vida muito boa. Moramos na capital de São Paulo, temos uma casa própria e que é
totalmente a nossa cara. Somos neta e vó, mas parecemos irmãs. E eu a vejo
assim, como minha irmã mais velha. Temos amigos, vizinhos, pessoas com quem
convivemos e que nos ajudaram nessa situação complicada.
Os resultados dos exames afirmaram nossas suspeitas: minha
avó precisaria ficar internada por tempo indeterminado. Até que se recuperasse
totalmente, precisaria ficar em observação e cuidados médicos. Ela não poderia
ficar sozinha em casa aos cuidados de uma jovem de 17 anos, que não podia
faltar da escola para cuidar da avó. Precisávamos de uma solução, e ela chegou
assim que meu celular tocou três dias depois do acidente.
- Alô?
Mariana?
- Sim,
a própria. Quem fala?
- Oi,
como tu está, criança? Não reconhece a minha voz?
- Estou
bem e desculpe, não reconheço. Quem fala?
- Meu
nome é Sônia, sou uma antiga amiga da sua avó. Faz tempo que não conversamos,
mas eu recebi a notícia de que ela sofreu um acidente dentro de casa e vocês
precisam de ajuda.
Neste momento, meu celular estava no viva-voz, e eu estava
no quarto conversando com a minha avó, tentando encontrar uma solução para o
nosso problema. Quando minha avó ouviu que era Sônia, ela roubou o celular da
minha mão e começaram a conversar.
Minha avó contou tudo o que tinha acontecido e claro,
colocou a culpa na vassoura que não sabia dançar direito. Sônia e a minha avó
eram antigas amigas, e fizeram juntas um curso de confeitaria. Sônia é
paulistana, mas casou-se com um gaúcho e foi morar com ele no Rio Grande do
Sul. Apesar disso, a amizade das duas nunca mudou, e sempre que se falavam –
isto é, quando minha avó tinha a paciência de mexer no celular ou no computador
– parecia que o tempo nunca tinha passado. Quando minha avó contou sobre o
dilema que estávamos vivendo, Sônia deu a ideia que mudaria minha vida toda.
-
Mariana podia ficar aqui comigo durante o tempo que tu estivesse se
recuperando. Acabamos de construir um quarto para o Pedro, e tenho certeza que
ele não se incomoda de emprestá-lo para a Mari dormir. Você estará em bons
cuidados no hospital, e a Mari em bons cuidados aqui. Vemos se conseguimos
trazer você pra cá, mas se não, me disponho a cuidar dela. O que tu acha?
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