Geraldo era o marido de Sônia. Eles se conheceram quando, em
uma noite chuvosa depois do curso de confeitaria que fazia com a minha avó,
Sônia precisava de um guarda-chuva e ele ofereceu o seu. Parece mesmo história
de cinema... minha avó jura ser verdade, apesar dela ter odiado Geraldo no
começo do namoro deles.
Ele era alto, muito branco e bem barrigudo! Tinha um grosso
bigode que escondia grande parte da sua boca. Ele tem uma Pet Shop. Lugar
simples, mas bem-sucedido por atender os clientes e seus animais sempre com o
mesmo carisma. Eu olhava para aquele homem me ajudando com a bagagem e falando
o quanto eu tinha crescido, e pensava que para ele não existiam dias ruins.
Assim que chegamos no estacionamento do aeroporto, além do
frio intenso que faz naquele estado, o que mais me chamou mais a atenção foi
uma van colorida coberta de patas de cachorro. Torci praquele não ser o nosso
transporte, mas não adiantou. Geraldo foi andando até lá e me chamando pelo
nome de “Mariane”. Acontece sempre, estou acostumada.
- E
guria! Desculpa vim com a van do pet... Sônia ficou com o carro comum para
poder ir no mercado, e fui obrigado a te buscar com a van. Ah, não temos bancos
atrás, pode ir lá para frente e colocando o cinto... deixa que eu arrumo suas
malas por aqui.
Assim que entrei na van, vi que não era de todo mau. Eu amo
cães apesar de nunca ter tido um. Minha avó sempre me disse que eles são mais
um filho, que precisam de atenção, de cuidados. Que custam tempo e dinheiro! E
mesmo que eu prometesse que cuidaria dele como um filho, ela dizia que sabia
que eu ia esquecer de dar ração e ela teria que cuidar.
Dentro da van cheirava à shampoo de cachorro. Quando notei
isso, caiu a ficha da onde o cheiro do abraço do Geraldo vinha na memória. Ele
cheirava à shampoo de cachorro! E sabem, isto não é ruim.
Olhei para uma foto que estava no vidro do carro, enquanto
Geraldo se encaixava juntamente com a barriga no lado do motorista.
- Essa
é a sua família agora, Mariane. – “MARIANA”, pensei.
- Quem
é quem?
Ele começou a me mostrar um por um.
- Essa
aqui é minha esposa Sônia. Esse é o nosso filho do meio, o João. Ele é bem
fechadão pras coisas, mas é bem estudioso e nos enche de orgulho com as suas
notas. Esse baixinho é o Fábio, o caçula. É um anjo, quando quer. Esse sou eu,
e aquele rapaz da ponta é meu filho mais velho, Pedro. Vocês brincavam muito
quando eram pequenos e íamos pra São Paulo. Mas aí abri a Pet Shop e os
encontros ficaram cada vez mais raros.
Apesar de ser uma linda família, de todos parecerem
simpáticos, prestei uma atenção especial em Pedro. Aquele rapaz da foto já foi
meu melhor amigo, e eu não conseguia lembrar nada sobre ele.
-
Conforme fomos passando pela cidade, pude perceber o quão
diferente era tudo de São Paulo. Os costumes, as pessoas, as roupas e até a
forma como as casas eram construídas... tudo bem diferente. Mesmo me sentindo
extremamente deslocada, no fundo eu tentava me convencer de que essa
experiência poderia ser boa pra mim. Pensei mesmo como minha avó sugeriu... “um
intercâmbio no mesmo país, poderei conhecer outra cultura!”
-Mari? Posso
te chamar assim?
Eu estava viajando nos meus pensamentos... havia um silêncio
constrangedor dentro do carro.
-
Claro.
- Eu
não disse ainda, mas lamento pela sua avó. Ela não gostava de mim, tentou me
separar de Sônia várias vezes, mas com o tempo aprendi a ser amigo dela. Eu sei
que pode ser ruim pra ti ficar aqui... uma cidade diferente, pessoas que tu mal
conhece, mas minha família vai te acolher e espero que tu se conforte logo.
-Claro
Sr Geraldo. Estou preocupada com a recuperação da minha avó, mas tenho fé que
ela ficará bem. E eu terei esse tempo pra conhecer vocês, né? – Sorri.
Geraldo sorriu de volta, e eu tive que me esforçar um pouco
para conseguir enxergar o sorriso debaixo do bigode.
-Isso
mesmo! Logo tu aprende a fazer churrasco e tomar chimarrão! Ah! Vou passar no
pet shop pra ver como o Pedro tá, quer descer?
Olhei pra fora, vi as pessoas bem agasalhadas... olhei para
a minha fina blusa de manga comprida e minha calça jeans com tênis e pensei mil
vezes.
- Posso
ir outro dia.
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